quinta-feira, 12 de março de 2009

recanto de paz

tu,
fim de tarde em tons crepusculares.
brisa marítima amena
mar
areia branca
pura
e um horizonte longíncuo por explorar,

neste areal alongado
que me sequestra a alma em sonhos
macadamizadamente.
me banha em tranquilidade e abre um recanto de paz
na minha alma desgastada.
alheio a toda a convulsão desorientada
na qual a vida me afogara
é aqui, agora e contigo que quero estar.

quarta-feira, 11 de março de 2009

barbeiro

a lamina na mão direita,
a espuma na esquerda
agarro o vagabundo no espelho em frente.
faço a barba à face suja da minha alma,
aparando, cortando,
memória após memória,
lá se vão as tormentas…
feito!
sinto-me nú, mas limpo
mais leve e sorridente,
com charme seduzir a vida
e seguir em frente.

despertar

são carros que passam, crianças que brincam e vida que jorra
ruidosamente, do lado de fora de mim
compenetrado pelo sol que conforta, em silêncio.
hoje a natureza embala, acolhe em tons vivos coloridamente,
celebrando
o sonho que regressa hibernado
de um inverno escuro em solidão.
respiro o ar morno desta tarde amena,
e penso que talvez
para estar aqui valeu a pena.
Enquanto não me decido
algures dentro da mim alguém (secretamente) rejubila:
Sobrevivi!

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

bastidores

hoje, sem querer, descobri
a vida desenfeitada.
nua, despida,
da fachada pomposa que a disfarçava,
entrei pela porta do camarim
enquanto se maquilhava
sorrateiramente,
encapuzado.

feia,

rugosa, marcada e pisada:
pobre senhora de idade,
polvilhava o pó de talco
que disfarça a realidade

ali o frasco dos sonhos,
acolá o da esperança,
mescla de amor regurgitado
com que aplica a elegância

estranha criatura aquela,
pobre senhora de idade
que se faz toda enfeitada
para disfarçar a fealdade

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

jaula

macacos me mordam!
que eu adormeci, .
a ver se me acordam.

quase me esqueci quem era.

eles que me mordam!
que eu quase morri,
a ver se espevito.

eles que me catem
os parasitas,
antes que apodreça.

eles que me arranquem
os pelos da barba,
talvez rejuvenesça...

macacos me suguem
o sangue da alma
a ver se desisto

de procurar algum sentido nisto.

a morte do artista

o meu pecado
foi ter-te amado
aberto o flanco
assim tão de lado
que sucumbi
anestesiado

o meu erro
foi ter amado
deixar-te fugir
sem ter agarrado
sonhar a sorrir
e dormir enganado

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

morte em camera lenta

acordei com a depressão a bater à porta,
não a deixei entrar – entrou na mesma
deitou-se ao meu lado,
e olhou-me nos olhos.

congelei de medo.
nunca a sentira tão perto,
o seu respirar, arrepiante.

não me movo.
não me atrevo.
sei que lá fora me espera o mundo,
carregado de verdade
de maldade e solidão enevoada.
não fujo.

horas a fio, sem me mexer.
deitado aqui,
à espera que passe,
que desapareça.
mas ela persiste,
sorri e resiste.

sei que me quer, faminta,
sentada ali
na outra ponta do quarto
sorrindo,
aguçando as garras,
à espera que eu me distraia.

não fujo.
faço-me de valente,
disfarço o medo fazendo de conta que não a vejo
mas ela continua ali
paciente,
esperando.

epílogo:

ignoro a fome
prefiro-lhe o enjoo de um cigarro atrás do outro
aliviam a pressão no meu peito
esta dor que me deixa sem jeito
esta inquietude dentro mim
que anuncia a mágoa por verter
e quando rebento por fim
em espasmos de enlouquecer
ponho um cadeado na minha cara
embebido em apatia; ninguém repara.